Era uma vez um dragão azul que vivia dentro do estômago de uma garota. Nem sempre esteve lá, apareceu quando sua hospedeira tinha por volta dos 5 anos de idade. Vagava no mundo quando algo lhe chamou a atenção – amígdalas extremamente suculentas sobre uma bandeja de aço inox, recentemente retiradas de uma pequenina garganta. Deliciou-se com elas e resolveu ir em busca de mais adentrando o mucoso túnel de onde elas tinham saído. Naturalmente não encontrou nenhuma, e movimentos peristálticos o conduziram até uma quente e agradável câmara que cheirava a comida. Resolveu se instalar permanentemente.
Devido a esse acontecimento, a criança que não gostava de comer passou a ser uma consumidora voraz de alimento, fato que deixava sua mãe e sua avó exultantes. Atribuíram o fato à cirurgia de adenóide a qual a criança foi submetida (mesma ocasião onde suas amígdalas foram retiradas), não chegando nem perto do real motivo. O dragão azul sentia-se muito bem instalado, a acomodação era confortável e era alimentado todas as vezes que desejava. Às vezes seu pedido não era prontamente atendido, e como nunca fora um dragão paciente, rugia em protesto, e insistia veementemente até ter sua vontade realizada. Para a garota o inquilinismo não era desconfortável, pois não abrigava um dragão egoísta, e este sempre lhe deixava o necessário para seu sustento e satisfação.
De princípio ele era, naturalmente, um dragão filhote. Chegou a sua plena estrutura física aos 8 anos de idade, tendo a garota então 13, e era necessário muita comida para alimentar um jovem e vistoso dragão azul. Comentários de toda sorte relacionando estrutura física com quantidade de alimento ingerido pela garota foram feitos, sendo o mais freqüente deles o comum “não engorda de ruim”. O comentário era estúpido, claro que ela não era uma má garota! Mas a estupidez deve-se a ignorância dos homens, que nada sabem da existência dos dragões inquilinos e tem por mania criar explicações para coisas que não compreendem, para não admitir que simplesmente desconhecem o motivo.
Hoje a garota beira as suas duas décadas de vida, e exatamente agora, às 11:57 da manhã, o dragão ruge aquecido em seu estômago.